sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Pedro foi o Primeiro Papa?

Há um pensamento geral entre os católicos de que Pedro foi o apóstolo que recebeu de Jesus a tarefa primordial de liderar os seus companheiros e fundar a Igreja. Este artigo foi elaborado exatamente no período das festividades conhecidas por “juninas” no ano de 2006, dentre as quais há um dia dedicado a Pedro.

Em entrevista a uma emissora de televisão da Paraíba, uma senhora católica afirmou sua fé e respeito por “São” Pedro, citando exatamente a passagem na qual ela acredita que Jesus comissionou o apóstolo a fundar a Igreja Católica. Outra entrevistada concluiu a referência ao texto bíblico, dizendo que Pedro é a “pedra” sobre a qual Jesus edificou Sua Igreja.[1]

As senhoras supra-citadas estavam fazendo referência à passagem do capítulo 16 do evangelho de Mateus, no verso 18, que diz: “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”.[2]

Mas era mesmo isso que Jesus quis dizer? Podemos afirmar, sem sombra de dúvidas, que Jesus colocou nas mãos de Pedro a liderança total sobre os demais apóstolos? A “pedra” a que Jesus Se referiu pode, realmente, ser entendida como sendo Pedro?

O presente estudo fará uma análise não exaustiva da passagem em questão, complementando com a pesquisa de outras referências bíblicas no Novo Testamento (ou NT), tentando chegar a uma conclusão para as questões inicialmente propostas sobre o papel real de Pedro na liderança da Igreja Cristã do tempo dos apóstolos.

Evangelho de Mateus: Escrito em Aramaico ou em Grego?

Um dos pilares do ensinamento católico sobre o papel de Pedro na fundação da Igreja está no fato de a igreja romana defender que foi a língua aramaica a utilizada na passagem de Mt 16:18. Nesta língua, as palavras “Pedro” e “pedra” são grafadas da mesma maneira: “kepha”. Dessa forma, a Igreja Católica fundamenta-se dizendo que Jesus fez de Pedro a “pedra” sobre a qual o Senhor edificou a Igreja.

Há algumas referências ao texto hebraico de Mateus, ocorridas entre os chamados “Pais da Igreja”, que parece abonar o argumento católico. Dentre tais referências, uma relevante é aquela atribuída a Papias, considerado um dos discípulos diretos do apóstolo João. Eusébio de Cesaréia, historiador cristão dos primeiros séculos, falecido por volta do ano 340 d.C., cita o seguinte:

Referente a Mateus, [Papias] diz o seguinte: ‘Mateus ordenou as sentenças em língua hebraica, mas cada um as traduzia como melhor podia’”.[3]

Baseado em referências patrísticas como esta é que a Igreja Católica fundamenta um dos seus principais argumentos acerca da interpretação de Mt 16:18 como Pedro sendo a pedra de edificação da Igreja, uma vez que, como citado anteriormente, no texto hebraico (aramaico) não há distinção entre “Pedro” (kepha) e “pedra” (kepha).

Porém os estudiosos não são unânimes em acreditar que Mateus escreveu realmente seu evangelho em aramaico (hebraico). Dentre os argumentos utilizados contra o pensamento de que este Evangelho não foi escrito em grego (como os outros três), podemos citar os seguintes:[4]

1. As várias citações que Mateus faz do Antigo Testamento não refletem uma única forma textual, ou seja, não são a própria versão de Mateus em aramaico tirada da Bíblia normalmente aceita pela Igreja Primitiva, que era a Septuaginta (LXX), a tradução do AT para o grego da época.[5]

2. O texto grego de Mateus não soa como uma tradução, pois apresenta muitas expressões que demonstram um profundo conhecimento do pensamento judaico, que os estudiosos chamam de “semitismos”.

O que tem sido aceito dentre importantes teólogos da atualidade é que Papias estava, na verdade, declarando que o “estilo” ou a “forma” literária utilizada por Mateus é que eram hebraicos, mas não a “escrita” em si.[6] O Dr. David Alan Black, por exemplo, cita a pesquisa de J. Kürzinger na qual a expressão utilizada por Papias (traduzida por: “em língua hebraica”), foi hebraidi dialektō, que pode significar tanto “em língua hebraica” quanto “em estilo hebraico”, dependendo do contexto.[7]

Segundo a pesquisa acima mencionada, no contexto em questão, Papias estava explicando alguns problemas quanto ao estilo e/ou conteúdo de Marcos, pois esse relato não possuía nem o estilo judaico de Mateus nem o estilo literário normal de uma biografia grega como o relato de Lucas.[8]

Esse erro de interpretação da citação de Papias, cometido inclusive por Orígenes, acabou sendo perpetuado por escritores posteriores, levando ao pensamento atual entre alguns teólogos de que o evangelho de Mateus foi escrito em hebraico, o que parece estar mesmo descartado.[9]

Breve Exegese do Texto Grego de Mt 16:18

Adotando-se a evidência de que Mateus escreveu seu evangelho em grego, assim como os demais escritores do NT, podemos realizar uma exegese não exaustiva das palavras gregas utilizadas por Mateus para “Pedro” (petros) e “pedra” (petra), para verificarmos que Jesus não colocou sobre Pedro a fundação da Igreja.

O texto em português foi traduzido assim: “Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela.”

A respeitada tradução espanhola, Reina Valera, verte o texto da seguinte forma: “Mas yo también te digo que tú eres Pedro; y sobre esta roca edificaré mi iglesia, y las puertas del Hades no prevalecerán contra ella.”

E no grego (transliterado), o texto fica assim:
kagw de soi legw oti su ei petrou kai epi tauth th petra oikodomhsw mou thn ekklhsian kai pulai adou ou katiscusousin authu ” (grifos acrescentados).
[10]

A palavra grega “petros”, ocorre cerca de 100 vezes no Novo Testamento, como original para o nome de Pedro (cf. 1Pe 1:1; 2Pe 1:1). Já “petra” ocorre apenas 4 vezes, sendo duas delas relacionadas diretamente a Jesus como sendo a Pedra (cf. 1Co 10:4; 1Pe 2:7-8).

1 Pedro 1:1 Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos que são forasteiros da Dispersão no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia,

2 Pedro 1:1 Simão Pedro, servo e apóstolo de Jesus Cristo, aos que conosco obtiveram fé igualmente preciosa na justiça do nosso Deus e Salvador Jesus Cristo,

1 Coríntios 10:4 e beberam da mesma fonte espiritual; porque bebiam de uma pedra espiritual que os seguia. E a pedra era Cristo.

(Grego Transliterado)
Coríntios 10:4 kai pantes to auto tsb=poma pneumatikon epion a=poma epinon gar ek pneumatikês akolouthousês petras ê tsb=de petra a=de ên o christos

1 Pedro 2:7 Para vós outros, portanto, os que credes, é a preciosidade; mas, para os descrentes, A pedra que os construtores rejeitaram, essa veio a ser a principal pedra, angular

1 Pedro 2:8 e: Pedra de tropeço e rocha de ofensa. São estes os que tropeçam na palavra, sendo desobedientes, para o que também foram postos.

(Grego Transliterado)

1 Pedro 2:7 umin oun ê timê tois pisteuousin a=apistousin tsb=apeithousin de a=lithos tsb=lithon on apedokimasan oi oikodomountes outos egenêthê eis kephalên gônias

1 Pedro 2:8 kai lithos proskommatos kai petra skandalou oi proskoptousin tô logô apeithountes eis o kai etethêsan

Há um pensamento comum, porém não irrefutável, de que “petros” é uma referência a um “pedregulho”, uma pedra de menor importância; enquanto que “petra” é uma “rocha”, uma pedra de maior durabilidade.[11]

Partindo deste ponto de vista, na verdade Jesus quis dizer que Pedro era uma pedra menor, enquanto Ele, Cristo, é a verdadeira pedra (ou rocha) sobre a qual a Igreja seria edificada.[12]

Pedro Era Mesmo o “Chefe” dos Apóstolos?

Além do estudo das palavras gregas empregadas por Jesus, algumas evidências internas nos revelam que, caso Jesus tenha realmente colocado sobre Pedro a primazia entre os demais apóstolos e líderes da Igreja, esta não foi a interpretação que eles mesmos deram às palavras de Cristo. Vejamos algumas dessas evidências encontradas dentro do próprio texto bíblico:

1. Os discípulos permaneceram com insinuações de quem seria considerado como o “maior” entre eles (cf. Mc 9:33-35). Isso certamente não aconteceria, caso Jesus tivesse colocado sobre Pedro a supremacia pastoral.

Marcos 9:33 -35 Tendo eles partido para Cafarnaum, estando ele em casa, interrogou os discípulos: De que é que discorríeis pelo caminho? Mas eles guardaram silêncio; porque, pelo caminho, haviam discutido entre si sobre quem era o maior. E ele, assentando-se, chamou os doze e lhes disse: Se alguém quer ser o primeiro, será o último e servo de todos.

2. Vemos em Mt 20:20-28 (claramente posterior à conversa do capítulo 16) que a mãe de Tiago e João fez um curioso pedido a Jesus: para que seus filhos fossem o n° 1 e o n° 2 no governo do reino de Cristo. Demonstrando claro descontentamento com tal pensamento, Jesus novamente expressa Seu desejo de que não haja este tipo de sentimento, onde um se considere superior aos demais. O conceito católico de “primo entre pares” parece encontrar aqui uma clara reprovação de Cristo.

Mateus 20:20-28 Então, se chegou a ele a mulher de Zebedeu, com seus filhos, e, adorando-o, pediu-lhe um favor. Perguntou-lhe ele: Que queres? Ela respondeu: Manda que, no teu reino, estes meus dois filhos se assentem, um à tua direita, e o outro à tua esquerda. Mas Jesus respondeu: Não sabeis o que pedis. Podeis vós beber o cálice que eu estou para beber? Responderam-lhe: Podemos. Então, lhes disse: Bebereis o meu cálice; mas o assentar-se à minha direita e à minha esquerda não me compete concedê-lo; é, porém, para aqueles a quem está preparado por meu Pai. Ora, ouvindo isto os dez, indignaram-se contra os dois irmãos. Então, Jesus, chamando-os, disse: Sabeis que os governadores dos povos os dominam e que os maiorais exercem autoridade sobre eles. Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós será vosso servo; tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos.

3. No Concílio de Jerusalém (At 15:1-29), por exemplo, também não há evidências de que Pedro tenha presidido tal reunião de líderes da Igreja, o que seria lógico, caso fosse ele realmente o líder maior, como advogam os católicos. Vemos que Pedro teve um papel importante (v. 7), assim como também tiveram Barnabé e Paulo (v. 12), e Tiago (v. 13), que parece ter dado a palavra final sobre o debate teológico em questão. O próprio Pedro já havia mencionado o nome de Tiago com certo destaque no governo da Igreja (cf. At 12:17).

Atos 15:1-29 Alguns indivíduos que desceram da Judéia ensinavam aos irmãos: Se não vos circuncidardes segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos. Tendo havido, da parte de Paulo e Barnabé, contenda e não pequena discussão com eles, resolveram que esses dois e alguns outros dentre eles subissem a Jerusalém, aos apóstolos e presbíteros, com respeito a esta questão. Enviados, pois, e até certo ponto acompanhados pela igreja, atravessaram as províncias da Fenícia e Samaria e, narrando a conversão dos gentios, causaram grande alegria a todos os irmãos. Tendo eles chegado a Jerusalém, foram bem recebidos pela igreja, pelos apóstolos e pelos presbíteros e relataram tudo o que Deus fizera com eles. Insurgiram-se, entretanto, alguns da seita dos fariseus que haviam crido, dizendo: É necessário circuncidá-los e determinar-lhes que observem a lei de Moisés. Então, se reuniram os apóstolos e os presbíteros para examinar a questão. Havendo grande debate, Pedro tomou a palavra e lhes disse: Irmãos, vós sabeis que, desde há muito, Deus me escolheu dentre vós para que, por meu intermédio, ouvissem os gentios a palavra do evangelho e cressem. Ora, Deus, que conhece os corações, lhes deu testemunho, concedendo o Espírito Santo a eles, como também a nós nos concedera. E não estabeleceu distinção alguma entre nós e eles, purificando-lhes pela fé o coração. Agora, pois, por que tentais a Deus, pondo sobre a cerviz dos discípulos um jugo que nem nossos pais puderam suportar, nem nós? Mas cremos que fomos salvos pela graça do Senhor Jesus, como também aqueles o foram. E toda a multidão silenciou, passando a ouvir a Barnabé e a Paulo, que contavam quantos sinais e prodígios Deus fizera por meio deles entre os gentios. Depois que eles terminaram, falou Tiago, dizendo: Irmãos, atentai nas minhas palavras: expôs Simão como Deus, primeiramente, visitou os gentios, a fim de constituir dentre eles um povo para o seu nome. Conferem com isto as palavras dos profetas, como está escrito: Cumpridas estas coisas, voltarei e reedificarei o tabernáculo caído de Davi; e, levantando-o de suas ruínas, restaurá-lo-ei. Para que os demais homens busquem o Senhor, e também todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, diz o Senhor, que faz estas coisas conhecidas desde séculos. Pelo que, julgo eu, não devemos perturbar aqueles que, dentre os gentios, se convertem a Deus, mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, bem como das relações sexuais ilícitas, da carne de animais sufocados e do sangue. Porque Moisés tem, em cada cidade, desde tempos antigos, os que o pregam nas sinagogas, onde é lido todos os sábados. Então, pareceu bem aos apóstolos e aos presbíteros, com toda a igreja, tendo elegido homens dentre eles, enviá-los, juntamente com Paulo e Barnabé, a Antioquia: foram Judas, chamado Barsabás, e Silas, homens notáveis entre os irmãos, escrevendo, por mão deles: Os irmãos, tanto os apóstolos como os presbíteros, aos irmãos de entre os gentios em Antioquia, Síria e Cilícia, saudações. Visto sabermos que alguns [que saíram] de entre nós, sem nenhuma autorização, vos têm perturbado com palavras, transtornando a vossa alma, pareceu-nos bem, chegados a pleno acordo, eleger alguns homens e enviá-los a vós outros com os nossos amados Barnabé e Paulo, homens que têm exposto a vida pelo nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Enviamos, portanto, Judas e Silas, os quais pessoalmente vos dirão também estas coisas. Pois pareceu bem ao Espírito Santo e a nós não vos impor maior encargo além destas coisas essenciais: que vos abstenhais das coisas sacrificadas a ídolos, bem como do sangue, da carne de animais sufocados e das relações sexuais ilícitas; destas coisas fareis bem se vos guardardes. Saúde.

Atos 12:17 Ele, porém, fazendo-lhes sinal com a mão para que se calassem, contou-lhes como o Senhor o tirara da prisão e acrescentou: Anunciai isto a Tiago e aos irmãos. E, saindo, retirou-se para outro lugar.


4. Paulo declara que não só Pedro, mas também Tiago e João, eram considerados “colunas” da Igreja (cf. Gl 2:9), o que mostra que a responsabilidade de liderança era dividida igualmente. E mesmo nessa citação, Paulo não menciona Pedro em primeiro lugar, o que poderia ter ocorrido caso houvesse alguma ordem de autoridade entre essas “colunas”.

Gálatas 2:9 e, quando conheceram a graça que me foi dada, Tiago, Cefas e João, que eram reputados colunas, me estenderam, a mim e a Barnabé, a destra de comunhão, a fim de que nós fôssemos para os gentios, e eles, para a circuncisão;

5. Na mesma epístola aos Gálatas, Paulo cita um curioso evento no qual ele repreendeu Pedro na presença de todos os demais discípulos (cf. Gl 2:11-16). Como poderia o apóstolo Paulo, que nem mesmo fora um dos 12, ousar repreender teologicamente o “papa” da Igreja?! Essa é, a meu ver, mais uma fortíssima evidência de que Pedro não era considerado o maioral dos apóstolos, muito menos possuía a infalibilidade (ex-catedra), arrogada pelos bispos de Roma da Idade Média até a atualidade. Paulo também condena aqueles que queriam colocar Pedro, ou qualquer outro, em posição de destaque (cf. 1Co 1:10-12).

Gálatas 2:11-16 Quando, porém, Cefas veio a Antioquia, resisti-lhe face a face, porque se tornara repreensível. Com efeito, antes de chegarem alguns da parte de Tiago, comia com os gentios; quando, porém, chegaram, afastou-se e, por fim, veio a apartar-se, temendo os da circuncisão. E também os demais judeus dissimularam com ele, a ponto de o próprio Barnabé ter-se deixado levar pela dissimulação deles. Quando, porém, vi que não procediam corretamente segundo a verdade do evangelho, disse a Cefas, na presença de todos: se, sendo tu judeu, vives como gentio e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus? Nós, judeus por natureza e não pecadores dentre os gentios, sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado.

6. O próprio Pedro se considerava um presbítero companheiro e igual aos demais (cf. 1Pe 5:1), o que mostra que ele não possuía tal pensamento de considerar-se melhor ou superior aos outros líderes. Aliás, há uma referência bíblica que demonstra claramente que não havia apenas um bispo em cada cidade, como quer a teologia católica, mas algumas delas poderiam ter vários, conforme, talvez, o tamanho de sua população convertida, como era o caso de Filipos (cf. Fp 1:1).

1 Pedro 5:1 Rogo, pois, aos presbíteros que há entre vós, eu, presbítero como eles, e testemunha dos sofrimentos de Cristo, e ainda co-participante da glória que há de ser revelada:

Filipenses 1:1 Paulo e Timóteo, servos de Cristo Jesus, a todos os santos em Cristo Jesus, inclusive bispos e diáconos que vivem em Filipos,

7. Interessante notar, ainda, que Pedro não é mencionado na carta de Paulo aos romanos, escrita por volta do ano 58 d.C. Isto pode ser uma forte evidência de que Pedro era, na verdade, um pregador itinerante (cf. 1Pe 1:1), e não o “bispo de Roma” como querem os católicos. Inclusive, Eusébio (citado acima) menciona que o primeiro “bispo” de Roma foi Lino (cf. 2Tm 4:21), logo após o martírio de Paulo e Pedro, considerados pelo historiador como os fundadores do evangelho em Roma.[13]

1 Pedro 1:1 Pedro, apóstolo de Jesus Cristo, aos eleitos que são forasteiros da Dispersão no Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia e Bitínia,

2 Timóteo 4:21 Apressa-te a vir antes do inverno. Êubulo te envia saudações; o mesmo fazem Prudente, Lino, Cláudia e os irmãos todos.

Uma Igreja Monárquica

Vemos que há um grande esforço na teologia católica em colocar sobre Pedro o fundamento humano da Igreja Cristã, sendo que, a partir dele, tal autoridade foi sendo transmitida ao longo dos séculos, de bispo para bispo (através do munus), mantendo-se uma estrutura hierárquica forte, onde no topo da “pirâmide” de poder está o papa, líder supremo da cristandade, para os católicos.

Esta estrutura hierárquica robusta e consistente, que tem se mantido ao longo de quase 2 milênios, parece não ter surgido realmente na declaração de Cristo a Pedro, como pregam os católicos, mas em uma ambição meramente humana, nascida na mente de um imperador romano, pretensamente convertido à fé cristã - o "famoso" Constantino.

O professor católico Luis Aznar, faz um interessante comentário em uma edição do livro História Eclesiástica, de Eusébio:

Culminava então (313 AD) a carreira política do imperador Constantino para a monarquia universal e absoluta. A audaz empresa exigia uma mudança substancial na concepção forjada por Augusto e retocada por Adriano e Deocleciano... Constantino compreendeu que necessitava do apoio das tenazes comunidades cristãs para edificar o novo império. Assim, desde que foi proclamado imperador pelo exército, em 306, tomou sob sua proteção os cristãos e ingressou entre os que podiam escutar a leitura dos evangelhos nos templos. Porém seu pensamento era político e não religioso. Queria organizar as comunidades episcopais autônomas em uma igreja universal.[14]

Vê-se que o objetivo por trás da instituição da hierarquia da Igreja Católica, encabeçada pelo papa, era mais uma estratégia política de dominação (que realmente deu certo!), do que o cumprimento de uma orientação divina.

Resumo e Conclusão

Não há evidências conclusivas sobre a composição em aramaico do evangelho de Mateus. A hipótese da escrita nesta língua é defendida por alguns teólogos católicos, por facilitar o argumento de que Jesus colocou sobre Pedro a autoridade de fundamentar a Sua Igreja, conforme o texto de Mt 16:18.

Porém, há fortes evidências de que o texto foi mesmo escrito em grego, no qual o “jogo” das palavras petros e petra pode indicar que Jesus colocou sobre Si mesmo, a Pedra angular (cf. At 4:11; 1Pe 2:7), a autoridade única de fundamento da Igreja Cristã.

Há também, dentro do próprio texto do Novo Testamento, fortes indicações de que Pedro não exerceu a função de líder maior da Igreja, como pôde ser visto no Concílio de Jerusalém, no debate com Paulo acerca dos ritos judaicos para os gentios conversos, da não-citação de Pedro na epístolas aos romanos, entre outros pontos que foram aqui analisados.

Podemos concluir, então, que Pedro era um importante apóstolo de Cristo, com papel de destaque em diversos acontecimentos ocorridos nas primeiras décadas da Igreja. Entretanto, ele não assumiu o papel de um “papa”, nos moldes que a Igreja Católica defende, nos quais Pedro teria iniciado uma “linhagem” papal, que foi transmitida ao longo dos séculos a cada “bispo de Roma”, chegando até o atual papa Bento XVI.

Pedro assumiu um papel relevante, sim, mas sem exercer supremacia sobre os demais apóstolos, bispos ou presbíteros da Igreja Primitiva.

A verdadeira Pedra sobre a qual Cristo edificaria Sua Igreja foi, sem sombra de dúvidas, Ele mesmo (cf. At 4:11).

Atos 4:11 Este Jesus é pedra rejeitada por vós, os construtores, a qual se tornou a pedra angular.
[1] A entrevista foi veiculada no telejornal “Bom Dia PB”, do dia 29/06/2006, pela emissora da Rede Globo.
[2] Salvo indicação contrária, as referências bíblicas do presente estudo serão da tradução de João Ferreira de Almeida, edição Revista e Atualizada no Brasil (Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1993).
[3] Eusébio de Cesaréia, História Eclesiástica, 3.39.14-16 (São Paulo: Novo Século, 1999), 113.
[4] D. A. Carson, Douglas J. Moo, e Leon Morris, Introdução ao Novo Testamento (São Paulo: Vida Nova, 1997), 70-78.
[5] É a primeira e mais importante versão grega do Antigo Testamento. Cf. Wilson Paroschi, Crítica textual do Novo Testamento (São Paulo: Vida Nova, 1993), 48.
[6] Carson, Douglas, e Morris, 77.
[7] David Alan Black, Por que 4 evangelhos? (São Paulo: Vida, 2004), 55-56.
[8] Ibid., 56. O autor também faz referência à ausência do artigo definido na frase hebraidi dialektō, como outro ponto forte de apoio à interpretação de que Papias estava mencionando o “estilo” hebraico de Mateus, e não a língua na qual o evangelho foi escrito.
[9] Ibid.
[10] As palavras em negrito são, respectivamente, “Pedro” e “pedra”.
[11] Colin Brown, New International Dictionary of the New Testament Theology, “petra”, (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1999), versão em CD-Rom.
[12] Para uma análise maior ver: Comentario Bíblico Adventista del Séptimo Día, tomo 5, versão em CD-Rom.
[13] Eusébio, 77, 91, 117.
[14] Eusébio, História Eclesiástica (Buenos Aires: Nova, 1950), 10, citado em uma apostila da matéria de Movimentos Religiosos Contemporâneos, do curso de bacharel em Teologia, do SALT-IAENE, 2003, pp. 36-37.

Fonte: Prof. Gilson Medeiros

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