Dietrich Bonhoeffer (1906-1945) lutou até o fim por suas convicções e foi enforcado por causa delas. Doutor em teologia pela Universidade de Berlim, Bonhoeffer ajudou a fundar a Igreja Confessante, que rejeitou desafiadoramente o nazismo. “Jesus Cristo, e não homem algum ou o Estado, é o nosso único Salvador”, proclamava. Em abril de 1943, o teólogo foi preso por ajudar judeus a fugirem para a suíça. Em 1945, três semanas antes de as tropas aliadas libertarem o campo em que ele estava, foi enforcado com o irmão Klaus e os cunhados Hans e Rüdiger.
Em toda a história do povo de Deus o martírio tem ocorrido e deixado claro para o Universo que seres humanos que amam a seu Criador estão dispostos a dar a vida por Ele e pelo que é certo. Misael, Ananias e Azarias também passaram por isso.
Nabucodonosor, vaidoso que era, mandou construir uma estátua enorme, toda em ouro. Lembra-se do sonho do capítulo 2? Apenas a cabeça, que representava Babilônia, era de ouro. Depois viriam outros reinos de metais diferentes. Pouco mais de duas décadas após ter tido o sonho,[1] as impressões iniciais causadas pela interpretação de Daniel se foram da mente do rei. Ao construir a estátua dourada, Nabucodonosor estava contrariando a profecia, como que dizendo que seu reino duraria para sempre.
Mas havia outra coisa envolvida nessa atitude do rei. Note que as medidas da estátua são um tanto estranhas: 60 côvados de altura por seis côvados de largura, ou seja, uns 30 metros por 3. Era quase uma “vareta”! Essas medidas não foram escolhidas por acaso. O seis é conhecido como o número do anticristo ou da imperfeição humana, em oposição ao sete, que representa a perfeição de Deus. Portanto, a repetição do seis na estátua era uma indicação de que ela simbolizava, na verdade, todo o panteão de deuses babilônicos (isso fica claro no verso 12). Nabucodonosor esteve perto de conhecer a verdade, mas se deixou levar pela vaidade. “Sentiu-se influenciado pelo temor de Deus; contudo, o seu coração não ficou purificado da ambição mundana e do desejo de exaltação” (Ellen G. White, Profetas e Reis, p. 504, 505).
Há uma lição para todo cristão aqui. Alguns acham que a experiência do passado (a conversão, o batismo, uma semana de oração, etc.) pode lhes garantir uma vida de sucesso espiritual. Isso é um engano. Se a relação com Deus não for alimentada diariamente – como o cultivo do amor no casamento, por exemplo –, a derrota é certa.
Bem, depois de construída a estátua, Nabucodonosor mandou convocar todos os oficiais da corte e os governantes vassalos de seu império. Reuniu-os na planície de Dura, diante do ídolo, e deu a ordem: assim que a banda tocasse, todos deveriam se prostrar em adoração à estátua. E ameaçou: se alguém não obedecesse, seria lançado na fornalha e viraria churrasco! E agora? O que fazer? Alguns devem ter racionalizado: “Mas é apenas uma estátua. Eu sei em que creio e não vejo problema em me ajoelhar apenas para preservar a vida.” Sabe o que é pior? Jerusalém era um reino vassalo. O rei dos israelitas estava ali. E se prostrou.
Quantas vezes, cegados pela falta de visão espiritual (lembra da importância da temperança e da clareza mental?), também acabamos cedendo e comprometendo nossos princípios: só vou beber um pouquinho para não ser rejeitado por meus amigos; é apenas uma prova no sábado; darei uma espiada nesse site pornográfico apenas por curiosidade; vou “ficar” com essa garota, afinal, todo mundo faz isso... E, quando menos se espera, o vício se instala e nossa fé desmorona.
A música também tem um poder tremendo sobre nós. Ela pode tanto nos aproximar de Deus, elevando nossos pensamentos, quanto pode nos distanciar das coisas do Céu. E Satanás sabe muito bem disso. Tanto é que usa a música “mundana” para minar a espiritualidade de muita gente.
Quando a banda começou a tocar o “rock babilônico”, o ambiente para a adoração idolátrica estava criado. Todo mundo caiu de joelhos diante do ídolo reluzente. Quer dizer, todos, menos três jovens. Você consegue imaginar a cena? Uma multidão prostrada com o rosto no chão e três moços imponentes, de pé, com a face marcada por santa convicção e consagração.
Era a oportunidade que os astrólogos queriam para eliminar a “concorrência” (esquecendo-se de que deviam a vida a Daniel). Foram levar ao rei a notícia do desafio dos hebreus, com palavras carregadas de veneno (cf. Dn 3:8-12). O rei conhecia os moços, assim como conhecia a Daniel.[2] E, por meio de ameaças, tentou dar-lhes segunda chance. Os jovens permaneceram firmes e deram uma resposta que nos ensina profunda lição de confiança em Deus: “Se formos lançados na fornalha de fogo ardente, o nosso Deus, a quem servimos, pode livrar-nos dela, e Ele nos livrará da tua mão, ó rei. Se não, fica sabendo, ó rei, que não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a estátua de ouro que levantaste” (v. 18).
Que fé! Essas palavras de profunda confiança assemelham-se em muito à oração submissa de Jesus, registrada em Mateus 26:39. Isso é fé. Confiança irrestrita em Deus, ainda que desabem os céus sobre nossa cabeça. Fé não é dizer: “Se Deus existe, vai me curar agora!” Fé não é sinônimo de prosperidade financeira automática. Não. Fé é aceitar que a graça do Senhor nos basta (2Co 12:9); que ainda que tenhamos que atravessar o “vale da sombra da morte” (Sl 23:4), Deus nos levará pela mão. É confiar que ainda que venhamos a morrer (Jó 13:15), Deus nos ressuscitará no último dia.
Enraivecido, Nabucodonosor ordenou que se aquecesse ainda mais a fornalha e que os três fossem lançados nela. Então, o milagre aconteceu. Os jovens foram preservados das chamas. Apenas as cordas com que foram amarrados acabaram incineradas. De repente, o rei se levantou assustado. Em meio ao fogo devorador, ele conseguia ver quatro homens caminhando tranquilamente, e pôde identificar o quarto como “semelhante ao Filho de Deus” (v. 25). Ellen White pergunta: “Como sabia o rei pagão a que era semelhante o Filho de Deus?” E ela mesma responde: “[Os hebreus] tinham falado de Cristo, o Redentor vindouro; e na aparência do quarto no meio do fogo, o rei reconheceu o Filho de Deus” (Profetas e Reis, p. 509).
A festa de adoração à imagem pagã acabou se tornando numa ocasião de reconhecimento do poder maravilhoso de Yahweh, o Deus Criador do Universo.
No futuro próximo, outros reis procurarão forçar a consciência dos servos de Deus. Um falso sistema de crenças será imposto no mundo. Novamente o número seis (agora 666) simbolizará o domínio do mal. Ficaremos firmes pelo que é certo, como fez o pastor Dietrich Bonhoeffer? Seremos fiéis mesmo em face da morte, como foram Mizael, Ananias e Azarias?
Isso depende de como estamos vivendo hoje. “Ou somos cristãos decididos de todo coração, ou nada somos” (Ellen G. White, Testemunhos Seletos, v. 1, p. 26).
(Michelson Borges, jornalista e mestre em teologia)
Pense e discuta:
1. O que você pode fazer para que as boas impressões do Espírito Santo não se apaguem de sua mente?
2. Em que áreas de sua vida você tem cedido e comprometido princípios?
3. Quão importante você acha que é a música na vida do cristão? Como escolher corretamente o tipo de música para ouvir?
4. O que é fé? Você sabe como desenvolvê-la?
5. Você se sente preparado para a controvérsia final em torno da adoração (a Deus ou ao anticristo)? Se não, o que pode fazer a respeito?
1. Segundo o Dr. Ozeas Caldas Moura, “podemos apenas conjecturar quanto à data dessa adoração. Uma boa hipótese é aquela que aponta a ocasião em que o rei Zedequias fez uma viagem à Babilônia (Jr 51:59), no 4º ano do seu reinado (594/593 a.C.), possivelmente atendendo à convocação de Nabucodonosor para que todos os seus magistrados e vassalos viessem à Babilônia para adorar a imagem de ouro (Dn 3:2). Se essa viagem do rei Zedequias foi para atender à convocação do rei babilônico, podemos imaginar o espanto dos jovens hebreus vendo o rei do povo de Deus adorando uma imagem – prática proibida pelo 1º e 2º mandamentos. E também o espanto do rei de Judá, ao ver seus súditos recusarem-se a se prostrar, mesmo correndo risco de morte” (Revista Adventista, março de 2009).
2. Por que Daniel não compareceu à adoração da imagem de Nabucodonosor? O Dr. Ozeas apresenta três hipóteses:
a) Poderia estar enfermo. Que Daniel geralmente tinha boa saúde pode ser inferido do cuidado que ele tinha com sua alimentação (Dn 1:8, 11-15). Mas ele não estava totalmente imune à doença, como pode ser visto em Dn 8:27: “Eu, Daniel, enfraqueci e estive enfermo alguns dias...”
b) Poderia ter recebido uma missão especial do rei, e estava em viagem pelo reino.
c) Poderia ter sido dispensado daquele ato de adoração pelo próprio Nabucodonosor. Aquele era um ato por meio do qual os súditos demonstravam lealdade ao rei, e Nabucodonosor não tinha dúvida quanto à lealdade de Daniel, tanto que o havia nomeado “governador de toda a província da Babilônia” (Dn 2:48). Assim, poderia tê-lo dispensado. Ao agir assim, estaria evitando duas situações: (1) matar Daniel, pois o rei sabia que esse fiel servo não se prostraria diante da imagem. Mas, como Daniel era um oficial altamente capaz, qualificado e honesto, o rei não desejava perder um auxiliar tão valioso; ou (2) ser desmoralizado perante os grandes de seu reino, ao permitir que Daniel ficasse impune, mesmo não se prostrando diante da estátua. Essa opção também não estava nos planos do rei, que era arrogante e prepotente (Dn 3:15, 19), e não deixaria que alguém o desmoralizasse e o humilhasse.
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Leia também: "Daniel 2 - A história do mundo em 49 versos"
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